Daqui pra frente as memórias desta viagem são frutos de um desejo estranho e confesso: um pouco confusa.
Entre 2011 e 2012, no período em que fazia Cinema na UFSC, fui tomado pela faísca de compreender melhor como o passado era retratado nos filmes, principalmente os que contemplavam os períodos de guerra e pós-guerra.
Como os sonhos eram vendidos, como as histórias eram reajustas em diversos pontos de vista, com diferentes narradores: em primeira pessoa, onisciente, subjetivo, todos criando conflito, drama, emoção e movimento.
A viagem para Tira, litoral sul do Líbano, me levou para um dos meus filmes favoritos, Valsa com Bashir - fruto da obsessão de estudante - , especificamente para uma cena em especial: quando o diretor - que havia esquecido de suas memórias da Guerra do Líbano de 82 - começa a lembrar da sua descida em uma das praias sul-libanesas.
Esse é um filme de animação documental, talvez o gênero soe estranho, mas nada mais coerente para representar as memórias do que esses símbolos que são atrelados as nossas emoções: as pessoas que nos envolvemos, o lugares que vamos, os cheiros que sentimos;
a palavra que é solta como uma bala em direção ao peito para dilacerar todo senso de realidade num mergulho salgado nas emoções passadas;
o sorriso que abraça primeiro no conforto da proteção com suas mãos e sufoca no aperto da atenção não recebida na primeira infância;
Memórias.
Boas, ruins, alertas de atenção ou siga em frente.
Memórias traumáticas.
Trauma: a tatuagem que envelheceu mal e é coberta pelo sol, pelo desgaste, por outra tatuagem, pelo esquecimento.
Memória ressignificada: quando o que se sofreu também pode ter o ponto de vista do que você venceu.
Esperança em conseguir ressignificar: o fio de vida que me mantém vivo.
Não descobri a fórmula contra a melancolia que tomou minha vida pós-traumática, tampouco sou de comparar os sofrimentos alheios e acreditar: pelo menos foi menos pior.
Ultrapassar o limite da dor não é ser forte, é perder força.
Histórias complexas geram seres complexos
No Líbano, óbvio é visível se você encontrar um ponto de atenção no meio do caos.
E o caos está em todas as memórias. A ordem vem depois. E, se vir, transformará a memória e você.
Assim como o Líbano me transformou.
De dentro pra fora.
Com carinho,
Lucas